De perto e amando ninguém é normal
por Helena Cunha di Ciero
A série é curta, são apenas 12 episódios. Mas a gente vai se envolvendo com o casal logo de cara, e cada vez mais intensamente, feito amor à primeira vista. Assistimos aflitos aos silêncios, aos impasses, sofremos com as distâncias e nos excitamos com as aproximações.
Doze curtos capítulos, que nos mostram que nenhuma série (assim como nenhum amor) precisa ser longa para reverberar por muito tempo. Desligar-nos da narrativa de ambos é tarefa difícil, eles nos tomam, nos arrebatam. Como uma paixão que custa a sair da mente, tamanho efeito hipnótico.
A trama gira em torno de Marianne (Daisy Edgar-Jones) e Connell (Paul Mescal), e se passa numa Irlanda acinzentada e fria. Ao longo das cenas, o telespectador vai percebendo a força desse vínculo. Baseada no livro de Sally Rooney, seu efeito é apaixonante, nos oferece um espelhamento do que é um amor normal. Ou, na verdade: o quanto não ficamos normais ao amar alguém.
Freud fala que nada nos torna mais frágeis do que o amor, pois é quando somos tomados por sentimentos conflitantes: euforia, impasses, dores, angústias, desamparo, paralizações e dolorosas escolhas.
Amar sangra, desorienta. Mas sangue é também fluido vital – e isso aparece o tempo todo na história: O poder do amor, de despertar do isolamento, do abandono, da depressão. A força reparadora desse sentimento tão fertilizante – que repara a dor.
Ao longo da série, a bela fotografia, antes de cores desvitalizadas, ganha tons fortes, tal qual o pulsar de um coração que cresce e se aquece ao ver a pessoa amada. Como um corpo morto que renasce com um beijo apaixonado. É mesmo essa ligação que gera a vida, nos dá contorno, segurança e conforto. Contudo, a série revela também o abismo que nos traz a ausência desse sentimento, assim como o buraco da falta de um outro tipo de amor, fundamental: o amor próprio.
São poucas as pessoas que realmente amamos na vida, isso fica claro a partir da série.
E há um motivo para serem poucas, a intensidade dessa ligação.
Confesso que sentirei saudades de contemplar o amor desses dois – sentimento que permanece após a televisão desligada.
Assim como certos amores que permanecem vivos em nossa alma, ainda que, na realidade, já não existam mais.